Após nova decisão judicial Petrobras começa a abastecer navios iranianos no Porto de Paranaguá

UUma nova liminar obtida na Justiça de Paranaguá garantiu que fosse iniciado, nas primeiras horas deste sábado, o abastecimento pela Petrobras dos dois navios iranianos Bavand e Termeh . As embarcações, fretadas pela empresa brasileira Eleva, estão no Porto de Paranaguá há mais de 50 dias e retornarão ao Irã ainda neste fim de semana , em uma viagem de 37 dias. A carga total, de 100 mil toneladas de milho, é avaliada em mais de R$ 100 milhões.

A Petrobras havia se recusado a vender combustível para as embarcações, por receio de ferir sanções norte-americanas aplicadas a empresas iranianas. Mas uma decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli , na quarta-feira, já havia obrigado a estatal a fornecer o combustível.

Toffoli rejeitou um recurso da Petrobras, que pedia para não efetuar o serviço. Ele revogou a liminar que ele próprio havia dado à companhia, que recorreu ao STF contra uma decisão obtida na Justiça do Paraná pela Eleva,  determinando o abastecimento das embarcações.

Em sua decisão, o presidente do STF julgou improcedente a alegação da Petrobras de que ficaria sujeita a sanções dos Estados Unidos. Ele afirmou ainda que os interesses nacionais e econômicos brasileiros poderiam ser prejudicados caso os navios continuassem sem combustível e não pudessem zarpar.

A decisão de Toffoli contrariou um parecer da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que na sexta-feira passada dissera que a Eleva teria alternativas para abastecer os navios, o que a empresa contestava. No parecer, Dodge citou um argumento recebido do Itamaraty de que o abastecimento pela Petrobras poderia causar prejuízo a “relações diplomáticas estratégicas” do Brasil.

Mesmo 48h depois da decisão do STF, a liminar foi obtida pelo escritório Kincaid Mendes Vianna, que representa a Eleva, na madrugada deste sábado, na Comarca de Paranaguá, garantindo o cumprimento da decisão do Supremo.

Segundo a assessoria do escritório, os graneleiros vão receber um total de 1.700 toneladas de combustível. O MV Bavand já está carregado com o milho para ser exportado e segue diretamente para o Irã. Já o MV Termeh irá para o Porto de Imbituba para receber a carga de milho, também para exportação.

Os dois navios trouxeram do Irã uma carga de ureia que já foi descarregada no mês passado e deveriam voltar ao país persa levando as 100 mil toneladas de milho  — o Irã é o terceiro maior importador dessa commodity brasileira. A operação de importação e exportação é classificada como “comércio compensado”, por não envolver pagamento iraniano em dinheiro, já que Teerã está com reservas reduzidas por causa das sanções aplicadas pelos EUA desde que abandonaram unilateralmente, em maio de 2018, o acordo nuclear assinado entre as principais potências e o país do Golfo Pérsico.

Alerta dos Estados Unidos

Como o GLOBO revelou nesta semana, o governo brasileiro foi alertado há cerca de três semanas pelo governo americano de que a importação de ureia do Irã está sob restrições impostas por Washington, e que empresas brasileiras, incluindo portos, que ajudassem a viabilizar o comércio do produto estariam sujeitas a sanções. Em sua estratégia de pressão máxima contra o Irã, o governo americano tenta inviabilizar o comércio do país persa com terceiros.

O presidente Jair  Bolsonaro  havia dito na sexta-feira que esperava ter uma solução para o caso neste fim de semana. Ele também já havia comentado que avisou os exportadores sobre o risco de negociar com os iranianos, e afirmou que o Brasil está ao lado dos EUA no caso.

— Estamos alinhados às políticas deles (EUA). Então, faremos o que for necessário — disse Bolsonaro nesta semana.

O chanceler Ernesto Araújo também defendeu, na sexta-feira, que a Petrobras cumprisse a decisão tomada pelo presidente do STF . No entanto, ele demonstrou preocupação com o risco de a estatal brasileira ser alvo de sanções dos EUA. Para ele, essa possibilidade ainda existe.

— O tema está na Justiça e nosso entendimento é que todas as partes envolvidas têm que seguir a determinação. Mas temos chamado atenção para o fato de que a Petrobras estaria sujeita a prejuízos em suas atividades nos EUA. Isso continua sendo o caso. Achamos que a situação permanece, mas existe o estado da lei, as companhias atuarão de acordo com a determinação da Justiça — afirmou.

Na quarta-feira, em entrevista à agência Bloomberg, o embaixador do Irã em Brasília, Seyed Ali Saghaeyan, ameaçou cortar suas importações do Brasil a menos que o país permita o reabastecimento dos dois navios.

O Brasil exporta cerca de US$ 2 bilhões por ano para o Irã, na maior parte commodities como milho, carne e açúcar.

— Disse aos brasileiros que eles devem resolver a questão, não os iranianos — afirmou Saghaeyan. — Se isso não for resolvido, talvez as autoridades em Teerã possam tomar alguma decisão porque este é um mercado livre e outros países estão disponíveis.

O embaixador disse que o Irã estava considerando mandar combustível aos navios, mesmo que essa opção levasse mais tempo e fosse mais cara.

— Países grandes e independentes como o Brasil e o Irã devem trabalhar juntos, sem interferência de outros países — disse o embaixador do Irã.